Blockchain na Indústria da Moda

Blockchain por uma Moda Justa e Transparente

O Impacto Oculto da Moda

A Moda é hoje uma indústria de trilhões de dólares e um dos maiores empregadores no mundo, sendo que três quartos do contingente de trabalhadores são mulheres. O Brasil é o quarto país em produção e consumo de denim, por exemplo, e em 2018 o setor têxtil empregava diretamente 1,5 milhão de pessoas, e gerava em torno de 8 milhões de empregos indiretos (ABIT, 2020). O porte do setor aliado a escândalos recentes trouxeram aumento da preocupação com o impacto social e ambiental das roupas que vestimos (WorldBank, 2019). Na frente ambiental, o ciclo da produção de fibras ao descarte de roupas consome e polui água, produz grandes quantidades de gases de efeito estufa e, muitas vezes, roupas de baixa qualidade têm um curto ciclo de vida, sendo descartadas em aterros ou incineradas (EllenMacArthurFoundation, 2017). Mas é no impacto social que o setor vem chamando mais atenção negativa, com evidências significativas de escravidão moderna (no inglês: modern slavery) ou trabalho análogo à escravidão, como é chamado no Brasil.

Impactos tanto de ordem ambiental, quanto de escravidão moderna não costumam ocorrer dentro dos muros das grandes marcas, mas sim em seus fornecedores, ou ainda nos fornecedores dos fornecedores (Busse, 2016; Tachizawa & Wong, 2014). Porém a maioria das empresas detém pouca ou nenhuma visibilidade sobre seu supply chain, e logo, são incapazes de assegurar práticas sustentáveis em seus fornecedores (Marques, 2019). Na Moda em particular, estudos tem enfatizado sua natureza intensiva em mão-de-obra, falta de visibilidade e ausência de processos maduros de responsabilidade social (Zorzini, Hendry, Huq, & Stevenson, 2015). A consequência é um alto risco de situações de escravidão moderna.

Escravidão Moderna: O Calcanhar de Aquiles da Moda

A prática de escravidão inicia sua história no passado distante de forma legalizada e chega nos dias de hoje como uma atividade criminalizada, porém largamente praticada em ambientes com alta informalidade e regulação fraca. A escravidão moderna tem caráter controverso e é difícil enfrentar este problema que está oculto em locais onde os padrões legais (e suas falhas) protegem quem o pratica. Ao estudar este tema, percebe-se claramente que nem tudo que é legal, é ético (Broad & Turnbull, 2019). A escravidão moderna não ocorre apenas quando a pessoa trabalha sem remuneração. Muitos trabalhadores nesta condição são remunerados, mas sofrem desumanização e restrição da liberdade, com condições inóspitas de higiene e dívidas desproporcionais com custos de moradia e alimentação que consomem mais de 100% de sua renda (Marques et al., 2019). Devido à percepção difusa sobre direitos humanos, muitos lugares não têm uma política clara para identificar, controlar e prevenir práticas de trabalho injustas (Broad & Turnbull, 2019).

A escravidão moderna é o Calcanhar de Aquiles da indústria da Moda, com seu formato de terceirização e quarteirização. Para enfrentar este problema, precisamos de um sistema que permita inspecionar o supply chain e identificar vítimas de escravidão moderna e práticas de trabalho injustas (ILO, 2017), em particular no Brasil onde falhas na legislação aumentam o problema.

Transparência Inóspita e Responsabilidade Turva

Em um estudo sobre mercados emergentes, Khanna e Palepu encontraram evidências da falta de “instituições formais que são necessárias para apoiar as operações básicas de negócios” (1997, p. 41) e eles chamaram essas lacunas de ‘vazios institucionais’. Os autores identificam cinco tipos de vazios institucionais: falta de intermediários e apoio institucional formal em (a) mercados de produto fracos, (b) mercados de trabalho não estruturados e (c) mercados de capital não estruturados, (d) ambiguidades nas regulamentações e (e) falta de sistemas formais de contratação. Juntos, estes vazios coexistem, estão interligados e se originam no contexto de pobreza. Apesar da heterogeneidade entre os diferentes mercados emergentes, todos eles ficam aquém, em certa medida, de fornecer as instituições necessárias para práticas éticas de negócio (Khanna & Palepu, 1997).

No Brasil, a transparência é particularmente prejudicada tanto pela falta de exigências de transparência quanto pela legislação que favorece a opacidade. Em nosso estudo anterior, cunhamos os termos ‘transparência inóspita’ e ‘responsabilidade turva’ para representar o vazio institucional regulatório. O termo transparência inóspita enfatiza o desafio de pesquisar, filtrar e baixar dados disponíveis publicamente. Em particular, temos feito um enorme esforço para mapear infrações e decisões judiciais sobre as condições de trabalho que estão disponíveis em uma base de dados online com baixo nível de consciência pública e difícil de ser avaliada e compreendida por não-advogados. Já o termo responsabilidade turva destaca a ampla utilização de terceirização e quarteirização no setor da Moda, que permite a grande marca explorar circunstâncias e interpretações da lei para se distanciar das práticas desleais praticadas por seus fornecedores, e principalmente, os fornecedores dos fornecedores. A consequência perversa destes dois elementos da legislação brasileira é a facilidade de separar a responsabilidade entre a empresa focal e os fornecedores (Marques et al., 2019).

O potencial do Blockchain no Supply Chain

Embora exista um número crescente de empresas divulgando a procedência de sua produção, esta tendência pode ser cara e os benefícios ainda não são claros (Sodhi & Tang, 2019). Em cadeias de suprimento pulverizadas como na Moda, transparência está diretamente ligada à visibilidade sobre os fornecedores em sequências de terceirização e quarteirização (Marques et al., 2019). Mas existe uma diferenciação importante entre visibilidade e a transparência do supply chain de marcas. Visibilidade está relacionada ao esforço da empresa em reunir informações sobre sua cadeia de suprimentos, enquanto transparência significa a divulgação destas informações reunidas para o público, investidores e consumidores (Sodhi & Tang, 2019). Embora muitas empresas invistam em visibilidade para melhor controlar sua cadeia de suprimentos, nem sempre isto se transforma em transparência efetiva (Marshall, McCarthy, McGrath, & Harrigan, 2016).

É no contexto acima que começam a surgir projetos inovadores para usar Blockchain para aumentar simultaneamente visibilidade e transparência do supply chain. Tendo um caráter mais confiável, autêntico e transparente, o Blockchain é proposto para melhorar nas duas dimensões (Azzi, Chamoun, & Sokhn, 2019).

Blockchain é um banco de dados não centralizado em uma estrutura de cadeia de blocos de registros públicos ou privados que tem como principais características: confiabilidade, sendo quase impossível de fraudar; rastreabilidade, cada etapa do processo é registrada em um bloco e as pessoas podem ter todas as informações sobre um objeto utilizando esta tecnologia; e autenticidade da informação, o responsável por verificar as informações que são carregadas no sistema não tem preconceito e é o mais imparcial possível (Tapscott & Tapscott, 2016). Quando há falta de confiança na cadeia de suprimentos, Blockchain pode viabilizar uma solução imparcial para melhorar a sustentabilidade social (Pournader, Shi, Seuring, & Koh, 2019), gerando um processo de garantia de direitos humanos e práticas de trabalho justas e seguras e também para reduzir a chance de comportamento oportunista (Saberi, Kouhizadeh, Sarkis, & Shen, 2018).

Existe um número crescente de trabalhos acadêmicos sobre Blockchain em cadeia de suprimentos (Pournader et al., 2019) e cada vez se identificam mais iniciativas e start-ups explorando esta tecnologia. Mas tanto na literatura, quanto nas aplicações reais, percebe-se a concentração em soluções para problemas econômicos e do meio ambiente (por ex: pegada de carbono), e assim, uma carência de exemplos e de proof-of-concept em que o Blockchain é aplicado para resolver questões sociais na cadeia de suprimentos (Pournader et al., 2019; Saberi et al., 2018).

Até que ponto Blockchain pode aumentar a rastreabilidade das condições de trabalho, com menor custo, no supply chain da Moda? E mais importante, como Blockchain pode ajudar a alinhar rastreabilidade com transparência efetiva para os diversos stakeholders?

Dois Coelhos com uma Cajadada: Custos de Transação e Melhoria da Sinalização

O quadro atual coloca dois grandes desafios para as empresas. O primeiro é como garantir visibilidade do supply chain dentro de custos factíveis. Os custos da transação no supply chain incluem os custos de desenvolver relações com os fornecedores, monitorá-los, gerenciar problemas que surjam e se proteger de oportunismo – ou seja – fornecedores tentando tirar vantagem na relação. Não é surpreendente pensar que Blockchain pode reduzir substancialmente os custos de transação (Kshetri, 2018; Treiblmaier, 2018). Estudos afirmam que no longo prazo, o Blockchain não só vai reduzir estes custos, como tornar mais atrativa a terceirização – já que ela estará mais controlada e segura (Shermin, 2017; Tapscott & Tapscott, 2016).

O segundo problema trata do desafio das empresas em reduzir a assimetria de informação no processo de comunicação com seus diversos stakeholders como clientes e investidores (Connelly et al., 2011). Historicamente, relatórios de sustentabilidade são a forma tradicional para a empresa comunicar e construir sua legitimidade, construindo confiança com seus stakeholders. Mas este é um processo muito estático e limitado. Ações de sustentabilidade podem ser difíceis de implementar, auditar e comunicar. Principalmente em setores complexos como a Moda, que contam com cadeias de suprimentos muito pulverizadas. Transparência exige altos custos e a falta de padrões e plataformas de tecnologia comuns pode representar desafios adicionais (Marshall et al., 2016). E embora a digitalização facilite a transparência, organizar e disseminar informações ainda é caro, sendo necessário estabelecer quais informações devem ser priorizadas (Fung, Graham, & Weil, 2007).

Nossas pesquisas apontam que, conforme o ditado, com uma cajadada só uma aplicação bem planejada de Blockchain pode simultaneamente (1) reduzir os custos de transação no supply chain, monitorando melhor os fornecedores, e (2) aumentar a qualidade da sinalização da empresa focal, ampliando a transparência para seus diversos stakeholders.

A Solução Moda Justa

O Moda Justa é a solução baseada em Blockchain que é capaz de revolucionar o supply chain da Moda atuando justamente na redução de custos e melhoria da sinalização, gerando visibilidade e transparência. O Moda Justa oferece um modelo inovador para capturar como costureiras na ponta do processo produtivo avaliam suas próprias condições de trabalho. Em modelos tradicionais de auditoria e selos de qualidade, cada fábrica ou facção (como são chamadas as células terceirizadas de costura) é auditada apenas uma vez por ano (Cardamone, 2020). Além de conversar com poucas costureiras em uma única visita anual, não existe confidencialidade, logo informações podem ser ocultadas por medo de retaliação, perpetuando impactos ocultos no supply chain. No Moda Justa, as costureiras são convidadas a responder a um mini questionário mensal no seu próprio aparelho de celular. As perguntas mapeiam as questões que os modelos tradicionais de certificação pretendem medir, mas de forma mensal, confidencial e diretamente junto às trabalhadoras. Este censo mensal permite mapear as condições de trabalho ao longo do tempo, com recortes demográficos e geográficos, bem como identificar tendências e antecipar o risco de violação de condições de trabalho usando tratamento estatístico. Além disso, os dados geram indicadores customizados para cada tipo de stakeholder.

O projeto iniciou seu planejamento em meados de 2018. Ao longo de 2019 um protótipo foi desenvolvido na colaboração entre Blockforce, COPPEAD, Instituto C&A e Instituto-e, contando ainda com as marcas C&A e Osklen como laboratório. O trabalho de campo permitiu o desenvolvimento de uma solução aderente à realidade do setor de Moda, e ao mesmo tempo inovadora.

Um Futuro Sem Impactos Ocultos

Governos, ONGs e a sociedade em geral estão cada dia exigindo mais transparência das marcas (Marques et al., 2019). A mídia tem incentivado a conscientização dos consumidores sobre os impactos ocultos da Moda e estimulado a pesquisa antes de decidir sobre a compra (Tucker, 2019). No Brasil, brasileiros estão cada vez mais responsáveis e conscientes (Nielsen, 2019) ou pelo menos demonstram vontade de desenvolver um estilo de vida mais sustentável (AKATU, 2019).

Não podemos deixar de destacar que a pandemia do covid-19 trouxe novos desafios para todos os atores deste setor e um alto volume demissões (Fashion Revolution, 2020). Mais do que nunca, não podemos deixar que a crise aumente a precarização do trabalho e a fragilidade da classe trabalhadora neste setor.

O Moda Justa é uma ferramenta que expõe e reduz os impactos ocultos de uma peça de roupa, de forma inteligente, e capturando informação de quem efetivamente produz as roupas. A solução reduz os custos de transação no supply chain, garantindo rastreabilidade das peças em tempo real. Também aumenta a qualidade da sinalização das marcas sobre seus processos e seus fornecedores, já que oferece rastreabilidade protegida pela tecnologia Blockchain. Por fim, oferece um dashboard confiável e adaptável para consumidores, investidores e órgãos reguladores acessarem o que está por trás das roupas produzidas. Desta forma, oferece um caminho para preencher o vazio institucional deixado pelas barreiras de transparência inóspita e responsabilidade turva identificadas no Brasil, usando tecnologia para garantir direitos de trabalhadores e (em sua maioria) trabalhadoras, e avançar na direção de uma moda mais justa e transparente.

Dr. Leonardo Marques

Referências Citadas
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Ignorância programada

Muitos de nós conhecemos bem o termo obsolescência programada. Se não o termo, certamente os efeitos de tal prática no nosso bolso e para o planeta, cada vez que precisamos comprar um novo eletrodoméstico pois o recém-adquirido quebrou e o conserto sairia mais caro. Agora, ignorância programada talvez seja uma novidade para alguns.

Li sobre esse termo num artigo da Folha de 2001 que falava sobre a síndrome do excesso de informação. Em um mundo que nos impõe uma enxurrada de informações minuto a minuto e um imaginário coletivo de que temos que dar conta de processar o ‘improcessável’, com o perdão do neologismo, os resultados são sentimentos de ansiedade e incompetência ou insuficiência. Neste contexto, surge então esse termo, ignorância programada, o qual consiste em uma ‘sábia decisão em tomarmos conhecimento somente daquilo que de fato nos interessa, programando-nos para ser, completa e orgulhosamenteignorante sem tudo o mais’. Retomemos, assim, a aceitação do sábio Sócrates que, apesar de se colocar ávido por novos conhecimentos, demonstrava tranquilidade em reconhecer que “só sei que nada sei”. Ou de Sherlock Homes, que justificou seu desconhecimento sobre o formato esférico do globo terrestre declarando ser esta uma informação secundária e, portanto, irrelevante para ele.

Muito radical? Limitador? Ou seria, libertador?

Em tempos de Covid-19, que nos coloca na frente de telas quase que ininterruptamente, acho a reflexão ainda mais pertinente. Toda (ou quase) a informação disponível no mundo a um clique… Quantas possibilidades. E quanta angústia! De minha parte, confesso que encontro um grau de alento na ideia de ignorância programada em meio a tantos papéis que exerço e tantas exigências internas e externas. Sigo, assim, na busca pela melhor forma de gerir esse paradoxo. De um lado, minha constante busca por me tornar uma pessoa melhor e por viver novas e desafiantes experiências profissionais. Por outro, reconheço que preciso de pausas mais frequentes, silenciar minha mente e me conectar mais com o momento presente. Como desafio desta década (talvez da vida), me dedico a caminhar na direção deste equilíbrio.

Não acredito em ‘one size fits all’ ou, em bom português, em ‘receitas de bolo’. Não costumam ser suficientes nem para fazer bolos, que dirá para alcançar uma vida plena e feliz. Mas sei que traz um conforto emocional ver o assunto resumido em tópicos de Do’s & Don’ts e pode despertar sim alguma reflexão na sua busca (única) pela tal vida plena e feliz. O que vem funcionando para mim, então? A prática da atenção plena na minha rotina e a meditação guiada pela respiração pelo menos uma vez ao dia. Considero caminhos acessíveis e possíveis dentro do nosso padrão atual de mentes controladoras e ativas ‘24/7’. Em breve escrevo mais sobre isso, na expectativa de tangibilizar um pouco mais tanta sabedoria oriental. Blocos de atividades protegidos de distração também são uma velha e ainda útil dica para que os projetos importantes não se percam em meio a tantas urgências e demandas circunstanciais. E como pilar de sustentação da busca por mais equilíbrio proponho o NÃO. Esta palavra monossílaba tão comum, que ouvimos desde bebês, mas que passamos a vida lutando para evitá-la ou driblá-la. Curiosamente pode ser de grande valia, se aprendermos a dar e receber, se for consciente, alinhado com nosso propósito e nossos valores. O conceito de ignorância programada abre espaço para experienciarmos o poder transformador e libertador de um não. Aproveite! 

Dr. Alice Erthal para a Newsletter REDE TRANSPARÊNCIA.

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Carta Aberta ao Meio Ambiente

Meu Querido Meio Ambiente,

À primeira vista, pode parecer que esta pandemia nos afastou… Afinal, já faz quase três meses que não te faço uma boa visita na praia, ou na lagoa… Passei uma vez por perto, mas não tive coragem de ficar e me alongar… Também não pegamos chuva juntos já tem um tempo… E aquela nossa brincadeira: eu correndo de um lado, e você com seu vento vindo na direção oposta… nem lembro qual foi a última vez, sabe… a verdade é que a gente só dá valor para aquilo que não temos mais…

Nestes dias de quarentena eu sempre te vejo de longe… clareando… escurecendo… ou então pelas fotos… Essa moda de mídias sociais funciona bem pra você… Vejo foto sua em todo lugar… Em Veneza, cheio de peixinhos ao redor… No céu da China sem fumaça suas estrelas apareceram tão bonitas… Tantos animais ocupando o espaço em centros urbanos esvaziados…

Não sei como você viaja tanto nessa quarentena… e como aguenta tanto Paparazzi… Bem, pelo menos assim consigo te acompanhar… E vejo que a quarentena te fez bem, olha só… Às vezes acho que enquanto eu engordo e fico cabeludo você vai sair dessa pandemia melhor do que entrou…

Você também aparece em mensagens, reportagens, relatórios de consultoria, estudos acadêmicos… é certamente meu amigo mais citado! Sinto que fala-se muito, porém poucos mudam realmente o comportamento com relação a você. E aí você com esse seu jeito: muito fotogênico, mas pouco comunicativo… ninguém te ouve… Seus amigos de verdade precisaram FALAR POR VOCÊ!

Sabe, tenho algo pra te confessar, hoje, neste dia especial. Este confinamento me fez refletir… e preciso admitir: quando era mais novo, não dava o valor devido para a nossa amizade… a gente se encontrava na praia e às vezes deixava o lixo pra você resolver sozinho…

Depois cresci, passei a dar valor ao nosso vínculo… mudei meu comportamento – você é testemunha! Só que recentemente, vendo você rodeado de tantos amigos… e de tantos inimigos também… confesso que cheguei a pensar: que diferença faz pra ele a minha amizade?

Agora refletindo enquanto escrevo esta carta, percebo que estava errado. Agora percebo que mesmo que você precise de muitos amigos para seus olhos voltarem a brilhar, suas ondas ficarem limpas, e seu ar mais puro, eu posso sim ser um destes amigos… posso fazer minha parte. Então te digo: estou aqui, para o que der e vier. Pode contar comigo. Vou me esforçar o quanto puder em nutrir a nossa amizade.

E olha, nada daquele “vamos marcar” de carioca… já tá marcado: quando tudo isso passar, um Nascer do sol e um Pôr do sol. Só eu e você.

E já ia me esquecendo: Feliz Aniversário! (Só comemoramos desde 1972, mas cá entre nós, você é bem mais velho que isso!)

Fique bem, enquanto a gente fica em casa,

Seu eterno amigo, Leo

Rio de Janeiro 05.06.20

II Fórum de Transparência & Sustentabilidade em Negócios

Fotos do II Fórum de Transparência & Sustentabilidade em Negócios

Evento realizado em 7 de fevereiro de 2020.

A verdade Crua & Nua

Depois da Newsletter passada “A Verdade Nua & Crua”, nos voltamos nesta edição para “A Verdade Crua & Nua”. Não sei se quem pensou neste ditado tinha o mesmo interesse que nós em moda e alimentos, mas é fato que estes dois setores andam de mão dadas nas pressões, desafios e busca de soluções para modelos mais transparentes e sustentáveis.

Nesta Edição, viramos o olhar da Moda para a Alimentação, e prestamos homenagem ao Professor Celso Lemme, notório pesquisador nas temáticas de sustentabilidade, governança corporativa que passa a integrar de forma generosa nosso a Rede Transparência e que há mais de uma década coleciona publicações e prêmios no tema de bem-estar animal (BEA). O contato com o Celso é motivo de orgulho e fonte de aprendizado para todos nós. Seu olhar crítico e sua prolífica produção intelectual mostra caminhos para que as empresas percebam não só o potencial de impacto, bem como as oportunidades que se colocam a frente com o crescente interesse dos diversos stakeholders em BEA.

Outro dia ouvi de uma amiga a frase: “no futuro, nossos descendentes vão olhar para trás e dizer – ‘como nossos antepassados eram primitivos… matavam animais a sangue frio e comiam…’. Não ouso fazer esta projeção, mas não podemos fechar nossos olhos para o impacto que o conceito de BEA terá na indústria de alimentos nos próximos anos. Cabe a cada um escolher como se posicionar.

É inevitável também pensar que transparência é chave para empresas da indústria de alimentos. Seja para comunicar seu posicionamento em relação ao BEA, seja para garantir a ausência de ingredientes nocivos [em uma lista que só aumenta a cada dia…], seja para informar a procedência dos insumos produtivos, ou ainda para assegurar que seus produtos sejam produzidos sob condições adequadas de trabalho, empresas de alimento precisam avançar para modelos mais transparentes. Se o alimento for de comum consumo de crianças, o grau de preocupação e reação à falta de transparência é exponencial. Afinal, queremos nossos filhos melhores que nós.

Movimentos internacionais como o Simplifying Ingredient Lists e Clean label pressionam empresas a serem transparentes quanto aos ingredientes em seus produtos. No Brasil, a Rede Rotulagem reúne diversas empresas do setor e defende rótulos mais claros e informativos, que incluam quantidades de açúcar, gordura e sódio, por exemplo. Mas ao mesmo tempo, este tipo de iniciativa muitas vezes pressiona por menos alarmismo da sociedade e por mudanças na legislação que respeitem o ritmo e limitações das empresas participantes… buscando assim evitar denúncias. Posicionamentos como este tornam o processo de avanço da transparência mais lento.

Por fim, perguntamos – como avançar na transparência sem colaboração na cadeia de suprimentos? Tomando a cadeia produtiva de frangos no Brasil como exemplo, um estudo do nosso grupo de pesquisa em 2018 mostrou que em um comparativo com vestuário, automóveis, e aço, o setor produtivo de frangos era o de maior desequilíbrio financeiro entre produtores [mais fracos] e marcas [mais fortes; logo, o menos sustentável no longo prazo. Juntando resultados de pesquisas diversas, indicamos que as empresas do setor de alimentos precisam despertar para temáticas como BEA, práticas colaborativas que equilibrem financeiramente os elos da cadeia produtiva, maior transparência e fomento à inovação, se não quiserem ficar com água na boca… enquanto inovadores conquistam os stakeholders.

Curtas:

  • Conforme prometido, na próxima semana vamos lançar esta Edição em formato podcast – desta formaoferecendo novo formato para aqueles que como eu estão usando os tempos de deslocamento para se atualizar [também vamos reproduzir as três edições anteriores]
  • Atualizem em suas agendas: nosso II Fórum Transparência & Sustentabilidade em Negócios será nos dias 7 e 8 de fevereiro de 2020. O Fórum será organizado em parceria com o Instituto Rio Moda, que é liderado pelos brilhantes Roberto Meireles e Alessandra Marins. O time do Rio Moda entrará em contato em breve com todos os convidados para participar das Mesas Temáticas
  • A partir desta Edição, incluímos a seção “Acervo de Resultados”, que reúne os posts feitos nas semanas anteriores em nossas mídias sociais. No acervo desta edição, mostramos o impacto positivo do algodão reciclado, a mudança de comportamento na adoção de copos biodegradáveis, e o baixo nível de monitoramento da cadeia de suprimentos de grandes empresas brasileiras nos temas de responsabilidade social e ambiental. Temos um longo caminho a percorrer…

Dr. Leonardo Marques
Professor do Instituto Coppead de Administração
Coordenador da Rede Transparência & Sustentabilidade em Negócios

Resenha do Artigo “Indústria de alimentos de origem animal: riscos e oportunidades para o setor decorrentes das políticas de bem-estar animal” do Prof. Celso Lemme

O assunto é muito mais complexo do que se pode pensar. Riscos e oportunidades decorrentes da gestão do BEA podem estar sendo negligenciados. Neste cenário, o pesquisador e professor do Instituto Coppead de Administração (UFRJ) Celso Lemme desenvolve diversos trabalhos voltados para o BEA e seus impactos, os quais o fizeram receber a “Medalha Temple Grandin de Bem-Estar Animal”  em 2018 e concorrer ao Prêmio BeefPoint 2014 – Edição Bem-estar Animal” na categoria de “Professor/Pesquisador Referência em BEA”. Em 2017, o professor, juntamente com Thomas Michael Hoag, publicou na Revista de Administração de Empresas (RAE) o artigo “Indústria de alimentos de origem animal: riscos e oportunidades para o setor decorrentes das políticas de bem-estar animal”. Nele, os autores analisam empresas de alimentos de origem animal e ONGs que tratam de BEA a fim de investigar os riscos e oportunidades que os ativos intangíveis das empresas enfrentam em relação ao bem-estar dos animais. O estudo se dividiu em duas etapas. A primeira foi o recolhimento e análise de informações públicas sobre as políticas e programas de BEA das empresas. A segunda etapa envolveu a análise de informações públicas de ONGs que atuam com BEA. As informações das empresas e ONGs foram cruzadas. Os autores mencionam os principais riscos para empresas que não consideram BEA no processo produtivo e oportunidades para aquelas que consideram. São eles:


Apesar dos diversos riscos e oportunidades envolvidos, os autores sugerem que a indústria de alimentos dá pouca atenção ao BEA, uma vez que apenas 53% das empresas estudadas mencionam BEA em seus relatórios corporativos. Por outro lado, 85% das ONGs estudadas discutem BEA em seus websites, o que indica a falta de sintonia entre as empresas e seus stakeholders. Para que todos os atores tornem o BEA uma oportunidade, os autores fazem as seguintes sugestões:

Clicando aqui, você encontra um explicação sobre o artigo pelo próprio professor Celso. Ou clique aqui para ler o artigo na íntegra.

O professor Celso Lemme compõe o corpo docente do Coppead desde 1999, onde atua nas áreas de Finanças e Sustentabilidade Corporativa, é também coordenador do Programa de Treinamento do Global Reporting Initative (GRI) e pesquisador sênior do grupo de pesquisa Rede Transparência e Sustentabilidade em Negócios, ambos no Coppead.  É presidente do Conselho Técnico-Consultivo do CDP Latin America, membro do Conselho Consultivo da Reserva Particular do Patrimônio Natural SESC Pantanal, membro da Comissão Permanente de Bem-Estar Animal do Ministério da Agricultura, Pecuária e Desenvolvimento e membro fundador do Fórum Ambiental da UFRJ. Em 2008, ganhou o prêmio de Melhor artigo do Encontro Nacional de Gestão Empresarial e Meio Ambiente (ENGEMA) e em 2009 uma dissertação de mestrado da qual foi orientador venceu o Prêmio Itaú de Finanças Sustentáveis. Saiba mais sobre o professor aqui.

Carolina Góes para a Newsletter Rede Transparência e Sustentabilidade em Negócios

“Pregando para Convertidos”

“Vamos precisar de todo mundo
Um mais um é sempre mais que dois…”
[O Sal da Terra, Beto Guedes]

Nos últimos meses, estive envolvido em algumas iniciativas sobre Sustentabilidade e Transparência. Em setembro do ano passado, participei do evento promovido pela TV Folha de São Paulo intitulado Transparência: Um Valor para a Moda e para o Mundo”, da série Diálogos Transformadores. Em fevereiro deste ano, organizamos nosso Primeiro Workshop da Rede Transparência aqui no Coppead, que foi foco da nossa Edição passada [acesse aqui]. E neste último dia 8 junho participei como palestrante na primeira edição do Rio Ethical Fashion um evento muito bem-vindo, em sua primeira edição e que se propõe a aprofundar a discussão de Ética e Transparência no ramo da Moda [saiba mais em https://www.rioethicalfashion.com/].


Refletindo sobre os três eventos, me chamou atenção o grande overlap de participantes. Ou seja, em grande maioria, sempre os mesmos, conversando entre si. Ou seja, estamos “pregando para convertidos”.
Utilizo este espaço para fazer um chamado. Precisamos trazer mais pessoas para a discussão. Vamos convidar novas pessoas para assinar nossa Newsletter. Convidá-las a participar dos eventos sobre o tema que nós participamos. Apresentar nossa visão de transparência [e a importância do tema nos dias de hoje] para pessoas não familiarizadas com o conceito.

Este chamado incluiu a disseminação de toda sorte de formatos e olhares sobre transparência. Precisamos produzir mais relatórios técnicos, artigos científicos, reportagens, e eventos, incluindo também frentes menos tradicionais, como Cultura e Arte. Minha grande amiga e artista Ana Lumack tem desenvolvido trabalhos interessantes para aproximar a cultura e dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). A primeira foto mostra sua criação para a campanha togetherband.org e a segunda foto traz a lista dos 17 ODSs. Ter cultura e arte como aliados pode ser fundamental para nos ajudar na disseminação do conceito de transparência.

Precisamos sair da inércia, expandir nossa área de atuação, e avançar para modelos de negócio, modelos de colaboração, e projetos mais transparentes!

Agora deixo vocês com as duas resenhas deste mês. Na primeira, fiz um vídeo de três minutos para apresentar meu artigo Sustainable supply network management: A systematic literature review from a knowledge perspective, publicado mês passado, que trata da importância da gestão do conhecimento como propulsor de sustentabilidade, e da colaboração em redes, envolvendo atores diversos, como propulsor da gestão do conhecimento.

Na segunda resenha, a Catia Moreira apresenta o conceito de consumer-centric transparency, inaugurando nossa série “Definindo Conceitos”. Na resenha, a Catia conecta conceitos apresentados nas resenhas da Edição anterior com a lógica consumer-centric. Recomendo a leitura.

Para se cadastrar em nossa lista, clique aqui

Fico por aqui. Até o mês que vem!

Dr. Leonardo Marques
Professor do Instituto Coppead de Administração
Coordenador da Rede Transparência & Sustentabilidade em Negócios

“A Verdade Nua & Crua”

Quem faz suas roupas? Quais as consequências de uma peça de roupa barata demais? A verdade nua e crua de todos aqueles que assim como eu não andam nus, é que simplesmente não sabemos responder a estas perguntas.

O custo real de uma peça de roupa deveria incluir todas as externalidades, ou seja, todos os impactos sociais e ambientais do processo produtivo. Somente desta forma se torna justa a comparação entre o preço de uma marca tradicional (que polua ou maltrate seus trabalhadores) e uma marca que verdadeiramente incorporou processos de baixo impacto socioambiental. Além de incorporar externalidades, as marcas precisam tornar seu impacto (ou melhor, a redução significativa do impacto) transparente. Como calcular o custo verdadeiro de um produto? A nossa pesquisadora Alice faz uma resenha sobre o importante documentário True Cost [leia abaixo].

Além de aferir o custo real dos produtos, precisamos repensar nosso modelo de consumo, migrando do conceito de posse, para o conceito de aluguel. Afinal, quantas vezes por ano você usa um casaco de inverno? Seria possível alugar ao invés de deixá-lo guardado 99% do tempo, correndo o risco de mofar, para usar nos poucos dias de inverno tropical? O Instituto C&A mostra que o mercado de economia compartilhada – a nova prática de swapping vai atingir 1 trilhão de reais em 2025.

Mas temos saída para estes desafios? Pedro Ruffier, fundador da Movin, marca inovadora em transparência acredita que sim. Ele e sua marca têm avançado na discussão de uma moda transparente e de modelos de economia circular e troca. Temos trabalhado juntos nesta direção e estamos montando um Caso de Ensino sobre a Movin. Sua empresa também tem uma história inovadora em transparência? Independente do segmento de mercado que atua tenha seu caso contado aqui na nossa Newsletter e transformado em Caso de Ensino para os cursos do COPPEAD. Clique aqui e escreva para nós

Enquanto refletimos tem gente se mexendo. Esta semana foi anunciado na França o Fashion Pact – uma iniciativa sem precedentes na moda que reúne 150 empresas para se engajar em três diferentes frentes: (1) aquecimento global (meta de zero emissões até 2050 para manter o aquecimento global abaixo de 1,5 grau até 2100); (2) restauração da biodiversidade; e (3) preservação de espécies e oceanos (principalmente reduzindo o uso de plásticos de uso único).

Ampliando o escopo da moda para o ambiente de negócios em geral, a The Economist pergunta esta semana: What companies are for? [Para que servem as empresas?] E completa “Across the West, capitalism is not working as well as it should” [Em todo Ocidente, o capitalismo não está funcionando tão bem como deveria]. A reportagem destaca que empresas estão sendo acusadas de pecados diversos, desde o foco excessivo no curto prazo, negligenciando investimentos, até a exploração da força de trabalho e falhas em pagar pelas externalidades produzidas por suas operações. Não deixe a verdade nua e crua te pegar de calças curtas quando a maré baixar. Venha com a gente!

Curtas:

  • A partir de agora nosso Newsletter será bimestral! E a partir da próxima edição, em formato escrito e podcast. Seguimos na busca do melhor mix de formato, periodicidade, e conteúdo para aumentar o impacto e alcance da nossa pesquisa. Sugestões são extremamente importantes.

  • Em breve teremos detalhes do nosso II Workshop da Rede Transparência, que será em Janeiro de 2020. Pretendemos triplicar de tamanho. Fique atento. Fico por aqui. Até Outubro.

Dr. Leonardo Marques
Professor do Instituto Coppead de Administração
Coordenador da Rede Transparência e Sustentabilidade em Negócios